A riqueza dos neologismos
O uso de neologismos (=palavras novas, sem registro em nossos
dicionários) é sempre um assunto polêmico. Há aqueles que rejeitam qualquer
novidade e aqueles que “topam tudo”.
A criação de novas palavras é comum em qualquer língua. É bastante
saudável. Há um enriquecimento vocabular e comprova o caráter evolutivo das
línguas vivas.
O problema é o modismo, o exagero, o termo desnecessário.
E aqui está, novamente, a dificuldade de ser moderado. O que
aceitar ou não? É uma questão muito subjetiva. Mais uma vez estamos diante de
um assunto que não pode ser tratado na base do certo ou do errado. Na minha
opinião, é uma questão de adequação.
Voltemos ao famoso caso do IMEXÍVEL. Teoricamente o processo de
formação da palavra é aceitável: raiz do verbo MEXER + prefixo “i” (=negação) +
sufixo “vel” (=possibilidade). Imexível = o que não se pode mexer. Seria o
mesmo caso de insubstituível, invisível, invencível, indestrutível… Na prática,
entretanto, temos um problema: devido à “fonte criadora”, a palavra imexível
carrega consigo uma carga pejorativa, o que torna o seu uso inadequado em
determinadas situações. Não acredito que eu venha a encontrá-la em algum texto
sério cuja linguagem seja mais formal.
Curiosamente, muitos neologismos são verbos, como ELENCAR,
ALAVANCAR, IMPACTAR e outros. Não vejo necessidade de “elencar”, se podemos
LISTAR, ENUMERAR, REUNIR, SELECIONAR… Para que “alavancar”, se podemos
IMPULSIONAR, ELEVAR ou LEVANTAR?
É importante lembrar que o verbo ALAVANCAR está devidamente
registrado em vários dicionários.
Quanto ao IMPACTAR, o problema é outro. No dicionário Michaelis,
IMPACTAR significa “tornar impacto, introduzir em outra coisa de modo que seja
impossível retirar, penetrar de modo irreversível”. Entretanto, no meio
empresarial, encontramos um uso no mínimo duvidoso: “Esta medida está
impactando a nossa empresa”. Isso pode ser bom ou ruim. Eu não sei se a carga
do verbo impactar é positiva ou negativa.
Para mim, mais importante que a palavra existir ou não em nossos
dicionários é a clareza da frase. Se a palavra selecionada deixa a frase com
duplo sentido, devemos evitá-la, a menos que a ambiguidade seja a nossa real
intenção.
Não sou contra os neologismos, e sim contra os modismos. É
importante lembrar que muitos neologismos já foram incorporados à nossa
linguagem do dia a dia e hoje estão devidamente registrados em nossos
dicionários: agilizar, minimizar, posicionar, sediar…
Devemos, portanto, ter cautela tanto no uso quanto na crítica a
quem usa.
Neologismos e hibridismos
Não se assuste. Eu explico: já vimos que neologismos são “palavras
novas”, que em geral não aparecem em nossos dicionários. Daí a tendência de
muita gente afirmar que a palavra não existe.
Muita gente reclama quanto ao uso de palavras como PROPINODUTO,
BIOTERRORISMO e SEQUESTRO-RELÂMPAGO, que, segundo nossos leitores, não existem
porque não foram encontratadas em dicionário algum.
É importante que se explique que a existência de uma palavra não
depende do registro de um dicionário. A palavra existe a partir do momento em
que se faz necessária e os falantes passam a utilizá-la normalmente. Cabe, no
caso, aos nossos dicionários fazer o devido registro em suas futuras edições.
A palavra nasce de acordo com a necessidade. Assim como toda
criança ao nascer recebe um nome, os fatos novos também merecem “um nome novo”.
A palavra BIOTERRORISMO só não aparecia em nossos dicionários porque não havia
“terrorismo biológico”. É fato novo, em razão disso: tudo contra o
bioterrorismo, mas nada contra a palavra BIOTERRORISMO.
Se inventaram um novo tipo de sequestro, por que não chamá-lo de
sequestro-relâmpago? Há muito tempo que, no futebol, se usa “gol-relâmpago” e
ninguém reclamou até hoje. Só quem toma o gol, é claro.
Quanto ao PROPINODUTO, achei muito criativo. Juntamos a propina
com o DUTO, que vem do latim e significa “que conduz”. Daí o oleoduto, que
“conduz óleo”, o gasoduto, que “conduz gás” e o viaduto, que “conduz a via”, e
não o que algumas mentes maldosas poderiam imaginar.
Quanto ao fato de misturar elementos de línguas diferentes
(propina = português + duto = latim; bio = grego + terrorismo = português),
nada contra. Isso se chama hibridismo (= mistura de elementos de diferentes
origens) e a nossa língua está cheia de exemplos consagrados: televisão
(grego+português), sambódromo (português+grego), camelódromo (português+
grego), automóvel (grego+português), decímetro (latim+grego), burocracia
(francês+grego), alcoólatra (árabe+grego)…
A palavra existe ou não, eis a questão.
O prefixo NEO vem do grego e significa “novo”. NEOLOGISMOS são
“palavras novas”, que não estão registradas em nossos dicionários nem no
Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, publicado pela Academia
Brasileira de Letras.
O uso de neologismos costuma gerar muita discussão.
Há quem adore as novidades e não faça restrição alguma ao seu uso,
e existem aqueles que só aceitam os neologismos depois de devidamente
registrados em algum dicionário. E aqui já temos um novo problema. Para o
brasileiro em geral, só há um dicionário: o Aurélio. É, sem dúvida, um dos
melhores e dos maiores dicionários do mundo. É bom lembrar que a edição lançada
em 1999 apresentava 28 mil novos verbetes. Temos de tomar muito cuidado ao
afirmar que tal palavra existe ou não. Quem tem o velho Aurélio pode ser traído
por uma nova edição. Recentemente, foi publicada uma nova edição pós-acordo
ortográfico.
É importante lembrar também que o dicionário Aurélio apresenta em
torno de 180 mil verbetes, que o dicionário Michaelis tem um pouco mais de 200
mil, e que o dicionário Houaiss apresenta aproximadamente 230 mil verbetes. É
muito perigoso afirmar que uma palavra existe ou não. Tem que pesquisar.
Usar ou não um neologismo torna-se uma questão um pouco subjetiva.
Por exemplo, você gosta do verbo DISPONIBILIZAR? É, sem dúvida, um verbo muito
usado no meio empresarial. É adorado por alguns e detestado por outros,
principalmente por aqueles que descobriram que DISPONIBILIZAR não estava
registrado no velho Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, e que não
aparecia em dicionário algum. Um aviso aos navegantes: o verbo DISPONIBILIZAR
já está registrado nas novas edições de nossos principais dicionários.
Agora, você decide. Qual é a sua preferência: “O governo vai disponibilizar
as verbas necessárias para as obras…” ou “Segundo o governo, as verbas
necessárias para as obras estarão disponíveis…”?
A aceitação de um neologismo pode provocar discussões sem fim. É
importante lembrar que os neologismos fazem parte da evolução das línguas
vivas. Muitas palavras que hoje estão nos nossos dicionários já foram, algum
dia, belos neologismos. Foram consagradas pelo uso e abonadas pelo tempo. E
aqui, a grande lição: nada como o tempo para provar se a palavra é boa ou não,
se é necessária ou não.
Leitor reclama: “Acabo de chegar da cidade de Natal, Rio Grande do
Norte, e lá é comum ler-se RETORNO SEMAFORIZADO”.
É como afirmei acima. Só o tempo vai nos dizer se a palavra é boa
ou ruim, se ela fica ou não. Tudo que é estranho hoje pode ser muito comum
daqui a alguns anos.
E não devemos esquecer que os neologismos enriquecem as línguas.
SEMAFORIZADO (palavra já registrada no novíssimo Aurélio) vem de SEMÁFORO,
palavra formada por elementos de origem grega: SEMA (=sinal, sentido, significado)
e FORO (=que faz, que produz). Para quem não conhece a palavra, SEMÁFORO é o
que o carioca chama de “sinal”, o paulista também chama de “farol”, o gaúcho
chama de “sinaleira” e assim por diante. Isso é riqueza vocabular.
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